sábado, 5 de abril de 2014

A Folha e os “fornecedores da Petrobrás”




5 de abril de 2014 | 11:34 
Autor: Miguel do Rosário

A nossa estatal de petróleo não é apenas a empresa que mais lucrou no país em 2013. É também a que mais investiu, a que mais pagou impostos, e uma das que mais gerou empregos.

A magnitude do valores movimentados pela estatal exige, por isso mesmo, que haja uma supervisão e um controle dignos de seu tamanho, e não apenas por parte das auditores internas da companhia, mas sobretudo dos poderes públicos, como Polícia Federal e Ministério Público.

Quando uma estatal aumenta em várias vezes o volume de seus investimentos, aumenta também logicamente o risco de corrupção, porque esses investimentos se materializarão na forma de grandes compras de equipamentos, serviços, mão-de-obra.

Essa é a importância da Operação Lava a Jato, tocada pela Polícia Federal, e que está desarticulando um esquema bilionário de lavagem de dinheiro.

Infelizmente, a nossa imprensa parece antes preocupada em atingir um determinado objetivo político do que fazer uma cobertura equilibrada e profissional dos grandes escândalos de corrupção.

As empresas que contrataram os serviços de “consultoria” do doleiro são chamadas de “fornecedores da Petrobrás”.




Só que elas não são apenas “fornecedores” da Petrobrás. São companhias que prestam serviços para todas as grandes empresas do país.

Se elas usaram os serviços de um doleiro, isso não tem nada a ver, a princípio, com a Petrobrás. Até porque elas não ganham dinheiro apenas da Petrobrás.

Vou dar só um exemplo: a Jaragua Equipamentos Industrial, que pagou R$ 1,94 milhão à MO Consultoria, empresa com “indícios de ser de fachada controlada por Youssef, o doleiro”, trabalha para os seguintes clientes




Voltemos à reportagem de capa da Folha. O jornal cita as seguintes empresas, que teriam contratado os serviços de um doleiro:



As firmas aí relacionadas, a começar pela que encabeça a lista, a Sanko Sider, estão ligadas, de uma forma ou outra, a todas as grandes obras feitas no país, tocadas pelo poder público federal, estadual, municipal, ou pelo setor privado.

A Petrobrás, por seu tamanho, trabalha com quase todas as grandes empresas brasileiras. E tudo relacionado à Petrobrás, de fato, é grande.

É curioso, todavia, que as empresas supostamente envolvidas em alguma mutreta agora percam sua personalidade própria e se tornem apenas “fornecedores” da Petrobrás.

Chamar a OAS de “fornecedora da Petrobrás” é quase uma piada. A OAS é uma das maiores empresas de construção civil da América Latina, ou mesmo do mundo. Ela também é uma das construtoras da linha 4 do metrô de São Paulo, por exemplo.

A empresa que teria pago os maiores valores ao doleiro Alexandre Yousseff, a Sanko Sider, tem uma relação direta pequena com a Petrobrás, com contratos de R$ 2,77 milhões em 2013. Sua relação com a Petrobrás seria indireta. Ela fornece equipamentos para empresas que, por sua vez, prestam serviços à Petrobrás.

A Sanko Sider também ganhou licitação para ser “fornecedora” da companhia de gás do Ceará, quando o estado era então governado pelo PSDB, em 2006.




A manchete certa da Folha, portanto, deveria ser: “Fornecedores de fornecedores da Petrobrás pagaram R$ 35 milhões a doleiro”.

Guardadas as devidas proporções, seria algo como “Motoboy que presta serviços para dono de restaurante onde Fulano da Silva jantou em março de 2012 é preso com cinco papelotes de cocaína”.

O fato do motoboy prestar serviços para dezenas de outros restaurantes não teria importância. O objetivo era pôr o nome de Fulano da Silva na manchete do jornal.