Como se sentiria um operador do
direito se alguém afirmasse que há suspeitas de que a mais alta autoridade do
Judiciário, o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) usa mão de gato,
pratica chicana, estupra os procedimentos à luz do dia e com as cortinas do
palco escancaradas? E que, na condição de presidente do STF, sua imagem pessoal
torna-se a imagem do Judiciário
20/04/2014
por: Luis Nassif
Em: jornalggn
No episódio da tentativa de espionagem sobre o Palácio do Planalto,
Barbosa agiu com mão de gato ou foi fundamentalmente displicente? O simples
fato de existir essa dúvida mostra a desmoralização a que o STF está submetido
com os atos de seu presidente, ao não se pronunciar sobre a tentativa do
Ministério Público do Distrito Federal de espionar o Palácio do Planalto.
O assessor de Barbosa, Wellington Geraldo Silva, telefonou para Jânio
para “uma exaltada cobrança telefônica”, sobre as suspeitas de que, por falta
de qualquer reação, Barbosa endossara a tentativa de espionar o Planalto.
Foi-lhe recomendado escrever para o Painel do Leitor.
Na carta enviada, o assessor alega que Barbosa tomou as providências
regimentais quando recebeu o pedido de quebra de sigilo do seu parceiro, o juiz
da Vara de Execuções Penais: sem ler,
encaminhou o pedido para apreciação do Procurador Geral da República. Só depois
do parecer da PGR, o presidente do STF manifestar-se-ia.
No entanto, quem analisar todos os passos da trama, terá muitos elementos
para suspeitar que, ao remeter o pedido para o PGR sem nenhuma observação, ou
ao não recusar o pedido liminarmente, o próprio Barbosa participou da
trama para espionar o Planalto – juntamente com a promotora Márcia Milhomens Sirotheau Corrêa, o
ex-juiz da Vara de Execuções de Brasília Bruno
Ribeiro.
Relembrando:
- A promotora Márcia
Milhomens Sirotheau Corrêa, da Vara de Execuções de Brasilia, pede a
quebra do sigilo telefônico de uma área que engloba o Palácio do Planalto.
- No seu último ato no
cargo, o juiz Bruno Ribeiro, que assumiu a função na Vara de Execuções
após a carga de Barbosa contra seu antecessor, recebe o pedido e envia
para Barbosa sem nenhuma consideração a mais. É de conhecimento geral as
afinidades criadas entre Barbosa e Ribeiro. Além da pressão contra seu
antecessor, Barbosa acionou o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) em defesa
de Ribeiro.
- Era de conhecimento de
Barbosa que, no mesmo dia em que enviou o processo, Ribeiro declarou-se
impedido de continuar atuando na Vara de Execuções.
- O presidente do STF
recebeu o pedido, não conferiu as coordenadas e enviou para a PGR. Se o
PGR também não conferisse as coordenadas, Barbosa teria o álibi para
quebrar o sigilo do Planalto.
As suposições acima são perfeitamente críveis, para um cargo em que não
se admite sequer a dúvida sobre a conduta do titular. Ainda mais com todo o
histórico de protelações de Barbosa sobre o episódio Dirceu.
É evidente que Barbosa sabia que o pedido de escuta referia-se a áreas
sensíveis, ao Palácio do Planalto ou a outro poder, caso contrário o próprio
juiz da Vara de Execuções poderia ter autorizado a quebra de sigilo.
Mas seguir procedimentos habituais em um caso absolutamente unusual - a
quebra do sigilo da própria Presidência da República - é um contrassenso que só
se explica pela vontade de postergar ao máximo a decisão sobre Dirceu, ou
então, de criar um fato político mesmo.
A alegação do assessor, de que Barbosa só poderia se manifestar após
parecer do PGR, em um tema que nada tem de usual, mereceu a resposta adequada
de Jânio: aceitar isso seria acreditar que o presidente do STF comporta-se como
um estafeta, recebendo processos e encaminhando sem ler para o PGR.
Passados vários dias, até agora a única manifestação de Barbosa foi essa
nota do assessor, segundo a qual ele cumpriu o regimento, remetendo o pedido
(sem ler) para o PGR.
É possível que o excesso de processos levasse Barbosa a ser descuidado
com o pedido. Mas é possível – dada a visibilidade do episódio – que o descuido
de Barbosa tivesse sido intencional. É possível que não atinasse para a
extensão do pedido. Mas também é possível que agisse em sintonia com o juiz
para criar uma crise política.
Agora, coloque-se no lugar de Joaquim Barbosa. Há uma investigação para
conferir um telefonema de José Dirceu, que teria sido dada em um dia definido.
Barbosa recebe um pedido de autorização de escuta por vários dias, em áreas
variadas. Supondo que seja displicente nos seus pedidos, que seja burocrático
no encaminhamento dos processos, alguém poderá supor que, ao receber o pedido
de quebra de sigilo, não tivesse sequer a curiosidade de conferir as
coordenadas definidas pela promotora?
É mais fácil um camelo passando no buraco de uma agulha.
Pergunto: é possível um presidente de STF conviver com tantas dúvidas e
suspeitas acerca de sua conduta, em um episódio da mais alta gravidade?