Publicado
originalmente na Salon.
Uma reportagem da
Associated Press revelou que há dois anos a Agência dos EUA para o Desenvolvimento
Internacional, USAID, criou um “Twitter cubano” cuja intenção era a de propagar
a insatisfação com o governo local. Conhecido como ZunZuneo – para os cubanos,
o som que faz o beija-flor – o sistema de mensagens de texto poderia contornar
a rigorosa regulamentação da internet de Cuba.
em 3
de abril de 2014
A USAID é geralmente conhecida
pela ajuda humanitária à comunidade internacional e não por se envolver em
missões secretas para derrubar regimes. No entanto, o porta-voz Matt Herrick
sustenta que esta ação tinha objetivos humanitários. Ele disse à Associated
Press:
“A USAID é uma agência de
desenvolvimento e não de inteligência, e nós trabalhamos em todo o mundo para
ajudar as pessoas a exercerem os seus direitos e liberdades fundamentais e
dar-lhes acesso a ferramentas para melhorar suas vidas e se conectar com o
mundo exterior. O governo tem tomado medidas para ser discreto em ambientes
não- permissivos? Claro. É assim que você protege o público. Em ambientes
hostis, muitas vezes tomamos medidas para proteger os parceiros com quem
estamos trabalhando. Isso não é exclusivo de Cuba”.
Métodos sofisticados evitaram que
o governo cubano detectasse as origens americanas da rede social. A USAID
utilizou empresas de fachada e contas bancárias offshore nas Ilhas Cayman para
cobrir suas trilhas. A fim de parecer autêntica, a home page do ZunZuneo teve
falsos anúncios em banners.
De posse de uma lista com
centenas de milhões de números de telefone fornecidas à USAID por um contato
dentro da emissora de televisão estatal Cubacel, a organização pôde enviar
mensagens de texto inócuas sobre temas como futebol. Os alvos eram os mais
jovens. Cerca de 40 mil deles tornaram-se adeptos.
Uma vez que havia seguidores
“suficientes”, eles começam a receber mensagens politicamente mais agressivas.
Houve também um website para que os internautas pudessem se inscrever, dar
feedback e enviar suas próprias mensagens de texto de graça.
A Associated Press relata que as
pessoas gostaram do sistema. Os estudantes de jornalismo da Universidade de
Havana Saimi Reyes Carmona e Ernesto Guerra Valdes se inscreveram. Guerra disse
que era “maravilhoso” e chamouo ZunZuneo de “a fada madrinha dos celulares”.
As mensagens foram armazenadas em
servidores de dois países, mas não nos Estados Unidos. Recrutaram-se “executivos
insuspeitos que não seriam avisados dos laços da empresa com o governo dos
Estados Unidos” para dirigir o projeto. A Creative Associates International,
empresa sem fins lucrativos com sede em Washington, e a Mobile Accord Inc, de
Denver, estavam envolvidas.
A missão tinha duplo objetivo.
Observando o papel que o SMS e o Twitter desempenharam nos levantes políticos
nas Filipinas e no Irã, a USAID viu no ZunZuneo uma ferramenta de política
externa em seu arsenal. A AP obteve documentos em que a USAID diz que queria
“empurrar Cuba para um impasse por meio de iniciativas temporárias e começar o
processo de transição para a mudança democrática.” O sistema de mensagens
também coletou dados dos usuários através de pesquisas.
Em um memorando da Mobile Accord
Inc., os gerentes de projetos reiteraram: “Não haverá absolutamente nenhuma
menção aos Estados Unidos ou sobre o envolvimento do governo. Isso é
absolutamente crucial para o sucesso da missão”.
A missão terminou em 2012 devido
ao imenso custo. No entanto, a legalidade é duvidosa. Uma operação secreta como
esta precisaria de autorização presidencial e notificação do Congresso. Não se
sabe ainda se sabemos se algum congressista ou mesmo o presidente estavam
cientes da operação.
O senador Patrick Leahy declarou:
“Há o risco de que jovens cubanos desavisados não tinham ideia de que esta era
uma atividade financiada pelo governo dos EUA. A natureza clandestina do
programa não foi divulgada ao subcomitê orçamentário e não teve nenhuma
responsabilidade de supervisão. E há o fato de que ele foi ativado logo a
prisão em Cuba de Alan Gross, um subcontratado da USAID que foi enviado à ilha
para ajudar a proporcionar aos cidadãos o acesso à Internet”.
Esse envolvimento dos Estados
Unidos em Cuba parece um túnel do tempo de volta à Guerra Fria. As relações
tinham melhorado, especialmente desde que Fidel Castro deixou o cargo e seu
irmão Raul Castro assumiu. Reformas econômicas baseados no mercado têm sido
postas em prática e algumas proibições de viagens foram suspensas em 2011 pela
administração Obama.
http://hosted.ap.org/dynamic/stories/U/US_SECRET_CUBAN_TWITTER?SITE=AP&SECTION=HOME&TEMPLATE=DEFAULT