Vários pensadores já sugeriram que a realidade não é o que vemos à nossa
volta, somos cercados de ilusão. Sócrates e Platão foram os primeiros, há
milênios, quando disseram, no mito da caverna, que o que vemos como realidade
sólida, não passa de sombras das cópias imperfeitas das verdadeiras coisas.
Jung afirmava
que nenhum ser humano percebe a realidade de forma que possa ser julgada
idêntica a de qualquer outro ser humano, devido à falibilidade de nossos
sentidos e à influência da evolução individual e particular de cada um. Segundo
ele, cada ser humano tem um ponto de vista próprio e exclusivo, por mais que
cultura e meio ambiente parecidos sejam compartilhados. Outros filósofos,
cientistas e escritores elaboraram também suas teses, que recentemente chegaram
a mainstream em filmes como Matrix, e o 13° Andar, além de vários outros, que
dizem que vivemos numa simulação, muito parecida com as que somos capazes de
criar hoje com a realidade virtual.
Então a
realidade, como percebida, não passa de fruto da imaginação, essa que, nesses
tempos de cartesianismo fundamentalista, é terreno exclusivo e depreciado de
artistas.
Imaginação é
exclusividade da raça humana, para o bem e para o mal. É a capacidade de criar
imagens, físicas ou mentais. Especula-se que a primeira imagem criada pelo
homem tenha sido a impressão da própria mão na areia, ou embebida em sangue de
algum animal e impressa na parede das cavernas. A mão se torna então, num
instrumento mágico que começa a ser educado para reproduzir imagens outras, de
caçadas e animais. Fazia parte do ritual da caça, que começava com o desenho
dos animais que se queria capturar futuramente, o retrato que aprisiona o
retratado, algo ainda presente em muitas culturas ditas primitivas. Ela evolui
para o que podemos chamar de precursora das religiões, quando alguém muito
esperto começa a associar fenômenos naturais a divindades, que passam a ganhar
representações imaginárias.
Com a evolução
humana, e da psiquê, as imagens evoluem também, elas são a linguagem universal e
podem ser lidas e compreendidas até por quem não sabe ler. Nos primórdios do
que nos habituamos a chamar de civilização, elas eram usadas na criação de
mitos que na realidade eram historinhas que explicavam, e perpetuavam
conhecimentos básicos. O Mito do Messias Solar, estudado por Jung, que começa
com o herói Mitras, continua com Rá, passa por José do Egito e culmina com
Cristo. Mas era só um almanaque astronômico que falava dos ciclos da natureza e
dava dicas sobre plantio e colheita, isso está explicadinho no filme Zeitgeist,
que usa parte da pesquisa de Jung e compara os mitos citados acima e as
'coincidências' através dos milênios que aproximam esses heróis.
Evoluindo um
pouco mais, as imagens começam a ganhar significados subjetivos, passam a representar
o que na realidade não retratam, e aí surgem os símbolos. Sinais são formas de
comunicação que não dependem de interpretação, eles carregam a mensagem em si _
fumaça é sinal de fogo, se um cão rosna para alguém, é sinal de que vai atacar
e por aí vai. Símbolo, do grego "sýmbolon", do verbo
"symbállein", "lançar com", arremessar ao mesmo tempo, dá a
noção de que tem que haver um consenso, um acordo para que o símbolo signifique
algo para que as partes que o criaram vejam sempre o mesmo significado, um anel
de ouro é símbolo de aliança entre duas pessoas e duas famílias.
Os antigos
alquimistas eram estudiosos dos símbolos criados milênios antes, que
supostamente guardavam os segredos da Natureza e da Inteligência Suprema. Os
maçons seguiam os mesmos ensinamentos gnósticos e estudavam e compreendiam
símbolos como até hoje a mente cartesiana é incapaz de vislumbrar. Não é a toa
que, após a independência dos EUA, os pais da nação, todos maçons, se
preocuparam em criar todo um sistema simbólico para unir a população mais
heterogênea que já colonizou uma porção de terra e chamou de país. O sino da
liberdade, que rachou de tanto bimbalhar, a constituição original até hoje
preservada, e mesmo o rascunho desta, impresso em papel de cannabis da
plantação de George Washington. Todo e qualquer bric a brac inútil, que tivesse
relação com o processo de independência, passou a ser venerado como símbolo,
uma forma de unir um povo que podia se dividir a qualquer momento, como a
guerra da Secessão mostrou pouco tempo depois.
Criara-se uma
nação imaginária, viciada em símbolos vazios que serviam como cola social para
integrar diferenças culturais, religiosas e históricas aparentemente
inconciliáveis. No processo de colonização dos EUA, gente de todo colorido
religioso, cultural e social migrou da Inglaterra, e outros países da Europa,
para um lugar onde as grandes dimensões geográficas tornavam a convivência
forçada quase desnecessária. Mas as diferenças estavam ali, latentes.
Puritanos, quackers, Amish, protestantes, católicos e o diabo a 4, se me
permitem o chiste. Ainda hoje um dos maiores temores do Estado é o
secessionismo, isso chegou a ser aventado após a reeleição de Obama. Essa
tradição maçom está estampada no nota do dollar e em todos os símbolos da
nação. Todos os brasões e emblemas de todos os órgãos de estado, se estudados,
revelam um simbolismo rico em detalhes e significados ocultos.
É nesse ambiente
de imaginação fértil, porém pouco produtiva, dadas as diferenças culturais
nunca totalmente integradas, que as técnicas de cinema criadas por Geoges
Meliés e pirateadas por Edison encontraram o terreno para o florescimento de
uma indústria que iria moldar a nação e um novo imaginário. É lá que a
imaginação vira indústria, instrumento de dominação e até colonização.
Esclareçamos aqui que as técnicas de Meliés tornavam a imaginação individual
quase que desnecessária. Seus cenários, efeitos especiais, maquiagem e
indumentária eliminavam a necessidade de imaginar a estória da forma que
fazemos quando lemos um livro, tudo era de facílima interpretação, se é que
mesmo isso fosse necessário. Estava criada a linguagem cinematográfica
explorada até hoje na indústria do cinema dos EUA, e que vem migrando até para
o Brasil através da GLOBO Filmes. Não é de admirar que estadunidenses tenham
tanta dificuldade em assistir filmes europeus, geralmente mais exigentes com a
inteligência do espectador, eles nos forçam a pensar, coisa difícil para os
nativos da terra de Tio Sam.
Ao longo da
história recente o cinema tem sido usado para moldar esse imaginário, e dominar
o povo. É através dele que se criam os mitos e heróis que abastecem o sistema
simbólico delineado pelos "Pais da Nação". Foi através do cinema que
o esperto J.Edgar Hoover catapultou o FBI, de um escritório burocrático e sem
poder, no que é hoje, com ajuda de Hollywood. Foi através do cinema que os
estadunidenses se esqueceram que os EUA demoraram quase 4 anos para entrar na
Segunda Grande Guerra, e depois dela, ignoraram que quem realmente a ganhou
foram os russos, eles se acham os grandes heróis e vitoriosos. O Holocausto
teve em Hollywood (controlada por judeus) seu maior marqueteiro. Durante a
depressão dos anos 30, Hollywood, a fábrica de sonhos, lucrou como nunca.
Afinal qual o melhor lugar para vender sonhos, se não no meio do maior
pesadelo da história de um país. Isso é maravilhosamente retratado no filme de
Woody Allen, A Rosa Púrpura do Cairo.
A construção
desse novo imaginário estadunidense ainda tem em Hollywood, mesmo nos mais
independentes diretores e produtores, o maior artífice da dominação. É quando
começamos a confundir realidade (mesmo que erroneamente percebida) com
imaginação e ficção, que corremos o maior perigo de sermos enganados. Num
sistema que tem a comunicação como instrumento maior e mais potente, é fácil
convencer um povo aculturado e de baixo nível educacional de qualquer coisa que
se queira.
Mesmo quando o
cinema é usado para desnudar e denunciar crimes de Estado, os fatos
apresentados como ficção, apesar de reais, entram no imaginário como ficção
pura e simples: "Ahh isso é coisa de Hollywood," é frequentemente
ouvido quando falamos da canalhice e covardia das guerras do Vietnam, e mais
recentemente Iraque. Ou quando falamos do envolvimento direto da CIA na criação
da Al Qaeda, ou das provas veementes de que algo de errado, muito errado, está
oculto no caso do 11 de setembro. Tudo vira teoria da conspiração, que até
rendeu um filme, tudo vira fantasia. Essa banalização é que abre o caminho para
que se explore o imaginário, para nele implantar a 'realidade' que se quer
impor, sempre com o intuito de dominar.
Assim é o povo
do país mais poderoso do mundo, iludido, manipulado e grudado na tela.
René Amaral
Dos blogs do Brasilianas.org
sex, 24/05/2013 - 21:33 –
Atualizado em 02/09/2013 - 06:26