Houve dois grandes oradores na Antiguidade: Cícero, romano, e
Demóstenes, grego.
Cícero nasceu com o dom.
Demóstenes (384-322 a.C.) é uma prova do extraordinário poder do esforço. Foi
graças ao treinamento meticuloso, rígido, persistente que Demóstenes se elevou
à imortalidade como um símbolo da força avassaladora das palavras.
Demóstenes, natural de Atenas,
era de uma família rica. Seu pai morreu quando ele tinha 8 anos. A herança
opulenta foi dilapidada por seus tutores, parte por má fé, parte por inépcia.
Garoto ainda, Demóstenes assistiu a um julgamento no qual um orador chamado
Calístrato teve um desempenho brilhante e, com sua verve, mudou um veredicto
que parecia selado. (Orador, lá para trás, era uma espécie de advogado de
hoje.)
Pronto. Demóstenes acabara de
saber o que queria ser quando crescesse. Esse episódio foi assim narrado pelo
historiador e filósofo grego Plutarco: “Demóstenes invejou a glória de
Calístrato ao ver a multidão escoltá-lo e felicitá-lo, mas ficou ainda mais
impressionado com o poder da palavra, que parecia capaz de levar tudo de
vencida”.
Ele entrou numa escola de oratória.
Assim que pôde, processou seus tutores. Ganhou a causa. Mas estava ainda longe
de ser notável. Um dia, desanimado, desabafou com um amigo ator. Gente bem
menos preparada que ele provocava melhor impressão nas pessoas. O amigo
pediu-lhe que recitasse um trecho de Eurípides ou de Sófocles, dois gigantes do
teatro grego. Demóstenes recitou. Em seguida, o amigou leu o mesmo trecho, com
o tom dramático de um ator. Era a mesma coisa, e ao mesmo tempo era tudo
inteiramente diferente.
Demóstenes montou então uma sala
subterrânea na qual se enfiava todo dia por demoradas horas para treinar,
treinar e ainda treinar. Chegava a raspar um dos lados da cabeça para não poder
sair de casa e assim praticar sem parar. Para aperfeiçoar a dicção, Demóstenes
punha pequenas pedras na boca enquanto falava. Fazia também parte de seu
treinamento declamar em plena corrida. Olhava-se demoradamente num grande
espelho para ver se sua expressão causava impacto.
“Vem daí a reputação de não ter
sido bem dotado pela natureza e só haver adquirido habilidade e força oratória
pelo trabalho incansável”, escreveu Plutarco. Ao contrário de outros grandes
oradores atenienses, Demóstenes não gostava de improvisar. Por isso os inimigos
o chamavam de embusteiro.
Quando a Grécia foi ameaçada por
Felipe, rei da Macedônia, a voz de Demóstenes ergueu-se tonitruante em defesa
de seu país. Mais que o exército grego, Felipe, pai de Alexandre, o Grande,
temeu e reverenciou a voz de Demóstenes.
Demóstenes retardou, mas não
impediu a queda dos gregos. Fugiu de Atenas para não ser morto, mas estava
perdido. Para não ser capturado pelos inimigos que o caçavam, matou-se com
veneno. Mais tarde, os atenienses construíram uma estátua para ele na qual
gravaram uma sentença célebre: ‘Se tivesses tido força igual à tua vontade,
Demóstenes, o guerreiro macedônico jamais dominaria a Grécia’.”
Postado em 20 Dec 2013
por : Paulo Nogueira
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é
fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do
Mundo.