A oposição, aí incluindo seus
tentáculos na mídia, tem o direito de comemorar a derrota política imposta pelo
chamado “blocão” contra o governo nesta terça-feira, ao criar uma comissão para
investigar negócios da Petrobrás na Holanda.
Por Miguel do Rosário
12/03/2014
É uma vitória que vale
especialmente para a centro-direita (ou direita mesmo) que apóia o governo de
má vontade, apenas por apego ao poder, como é o caso de parcela do PMDB e quase
todo PSD, cujos membros saíram do DEM à procura de sombra e água fresca.
Entretanto, esse movimento tem
dois lados.
De um lado, mostra a força do
blocão, que agora tentará usar isso para ampliar as chantagens contra o
governo.
De outro, revela, para o governo,
quem são seus verdadeiros aliados, e quem está pronto para lhe passar a perna
na primeira oportunidade.
Em ano de eleição, é muito bom
saber, com certeza, quem está do seu lado de verdade.
O Congresso tem 513 deputados. O
blocão conseguiu exatamente a metade do total: 257 deputados.
A turma de Eduardo Cunha assinou
uma declaração de guerra. Uma guerra surda, porque entre aliados em tese, mas
por isso mesmo ainda mais fratricida e sangrenta.
No Painel da Folha, há a
informação de que Eduardo Cunha disse a Michel Temer que o PT tem um “projeto
hegemônico que afasta aos poucos os partidos da coalização”.
Pode até ser. Mas Cunha tem um
ponto-fraco. Ele confia demais em jogadas palacianas, e esquece que o poder
político, seja do PT, seja do PMDB, seja do governo, seja da oposição, só tem
uma fonte real: o voto.
O PMDB foi o único partido da
base que perdeu filiados em 2013. Por quê? Porque não está mudando. Não está discutindo
teses, programas, ideologias, projetos de país. O adversário do PMDB não é o
PT, é seu próprio espelho. É um partido grande, capilarizado, que governa
milhares de municípios, e que poderia contribuir muito mais para o debate
político nacional se investisse mais em… debates, e menos em figuras
questionáveis como Eduardo Cunha.
Afinal, o que quer o PMDB? Que o
PT, ou qualquer partido que estiver no governo, lhe garanta algum tipo de cota
fixa, imutável, em troca de seu apoio no Congresso?
Na verdade, o PMDB faz um jogo
duplo. Ele apóia o governo, de um lado, mas surfa no antipetismo, de outro. Até
aí tudo bem, é da política.
Mas haverá um momento em que o
partido terá de se decidir. Essa postura de ameaçar o governo com um possível
apoio a Aécio Neves apenas ridiculariza o PMDB, porque revela um partido sem
substância, disposto a apoiar qualquer um, desde que lhe pague bem. Ao agir
assim, as eleições se tornarão cada vez mais caras para o PMDB, porque ele terá
cada vez menos o voto das pessoas politizadas, e precisará cada vez mais do
voto fisiológico, comprado a peso de ouro de um eleitor cada vez mais cético,
num mercado eleitoral cada vez mais competitivo.
Tem uma senhora cujos serviços de
faxina eu contrato de vez em quando que me contou uma coisa engraçada. È triste
por um lado, até porque isso não deve ser legal, mas engraçado também. Os
políticos lhe dão dinheiro para que ela distribua aos eleitores da região.
Compra de voto descarada. O eleitor vai à casa dela, dá o número do título, e
recebe R$ 50.
Aí entra a parte engraçada. Tem
eleitor que vendeu seu voto para mais de cinco candidatos diferentes. Ou seja,
o político, quando pensa que está enganando o eleitor, está é levando uma
rasteira, merecida, do cidadão. O cidadão pega o dinheiro, evidentemente porque
está precisando, mas não vota no candidato que lhe deu o recurso. Ou pode até
votar num daqueles que lhe deu dinheiro, mas vota naquele de sua preferência.
Ou seja, o recurso à compra de voto fica cada vez mais caro, pois o voto é
secreto, protegendo o eleitor.
Voltando à “vitória” do blocão
sobre o governo, tenho a impressão que muitos parlamentares que se recusaram a
participar do jogo sujo de chantagem política liderado por Eduardo Cunha se
identificarão com esta frase de Darcy Ribeiro, que o colega de Twitter, Mario
Marona, lembrou nesta manhã, ao publicar a foto abaixo.
“Eu detestaria estar no lugar de quem
me venceu”.
O blocão, foto de Pedro Ladeira, na 1ª página da
Folha de hoje