O Congresso dos EUA está
definindo o que é ser jornalista, criando um perigoso precedente que pode
reescrever sua famosa Primeira Emenda, ameaçando também a mais poderosa rede de
troca de informações na História recente
Após a revelação de que o Departamento
de Justiça utilizou históricos telefônicos de jornalistas da
Associated Press (AP) como parte de uma investigação de vazamento de
informações, membros do Congresso reintroduziram o Free Flow of
Information Act (Lei de Fluxo Livre da Informação), também
conhecido como o escudo federal da imprensa por meio da lei. O princípio básico
é proteger jornalistas de ter que revelar fontes confidenciais ao governo.
O maior defensor do projeto de
lei é o congressista democrata por Nova York, Chuck Schumer, que alega ter
grande suporte de seus pares, incluindo cinco membros do adversário Partido
Republicano. Espera-se que a proposta vá para votação em abril.
Mas aqui o diabo se esconde nos
detalhes. Enquanto a lei realmente estende algumas proteções para alguns
jornalistas, ela é bem particular a respeito de quem ela cobre. A jornalista da
AP, Donna Cossata, explica:
“As proteções da lei se
aplicariam apenas a “jornalistas cobertos”, definidos como um empregado,
contratado independente ou funcionário de uma entidade que dissemina notícias e
informações. O indivíduo teria que estar empregado por pelo menos um ano dentro
dos últimos 20 anos; ou por três meses dentro dos últimos cinco anos”;
“Ela se aplicaria a estudantes de
jornalismo ou alguém com considerável acúmulo de trabalho free-lance nos
últimos cinco anos. Um juiz federal também teria a competência de declarar um
indivíduo como um “jornalista coberto”, tendo garantidos os privilégios da
lei”;
“A proposta também diz que
informação será protegida apenas se for disseminada por um meio de comunicação,
descrito como “jornal, livros de não-ficção, agência de notícias, site de
notícias, aplicativo de celular ou outros serviços de notícias e informação
(seja se for distribuído digitalmente ou de outra maneira); noticiários, revistas
ou outros periódicos – seja impresso, eletrônico ou em outro formato; televisão
e rádios também estão incluídos”.
Quem não está incluído na
proposta de lei? Blogueiros e pessoas que postam em mídias sociais. Em outras
palavras, a lei praticamente privilegia jornalistas cujas organizações têm
dinheiro – como mídia impressa – ao contrário da mais acessível forma de mídia,
onde qualquer um pode disseminar informação rapidamente.
A ironia em deixar de fora os
blogueiros de tais proteções por eles não serem importantes o suficiente para o
tipo de jornalismo contemplado pela lei é que já existem casos notórios onde
estão sendo perseguidos após conseguirem furos jornalísticos. Schumer e outros
congressistas patrocinando a lei poderiam facilmente olhar para a coluna Dealbook, do
dia 17 de março no New York Times, onde detalha como o gerente de
fundos hedge, David Einhorn, está tentado forçar o blog de finanças Seeking
Alpha, a revelar quem foi o blogueiro que vazou detalhes de seu investimento na
empresa Micron Technology.
Enquanto blogueiros são
explicitamente deixados de fora das proteções da proposta, outros, como o
WikiLeaks, estão em áreas ainda mais nebulosas. Quando perguntado se o criador
do site, Julian Assange, estaria coberto pela lei, Schumer
disse não saber; perguntado sobre a organização First Look de Glenn
Greenwald, Schumer respondeu que “provavelmente não havia proteção o suficiente
para cobri-lo, mas é melhor do que a lei atual”.
A atual proposta perante o
Congresso tem o apoio da administração Obama, a qual não fez nenhum
estardalhaço a respeito de suas exclusões do novo tipo de mídia jornalística;
mas outras ações da administração indicam que o governo leva muito a sério as
redes sociais, pelo menos em outros países. Quando o governo turco bloqueou o
Twitter recentemente, a Casa Branca fez
um anúncio forte defendendo a liberdade de expressão e o valor que as
mídias sociais têm nesse país: “Nós nos opomos a essa restrição no acesso do
povo turco à informação, a qual sabota sua habilidade em exercer liberdades de
expressão e associações, e não vai ao encontro dos princípios de governança
aberta”, disse o secretário de imprensa da Casa Branca, Jay Carney.
Sem as proteções para as novas
mídias e jornalistas não-tradicionais, a Freedom Flow of Information Act, pode
muito bem terminar fazendo um pouco mais que juntar uma nova rede de guardiões
– organizações de mídias tradicionais que ditam o jogo sobre quais vazamentos
serão ou não publicados, ao contrário da relativamente aberta rede social e
blogosfera.
Por Redação
março 25, 2014 16:45
Por Zaid Jilani, em Alternet
Tradução: Vinicius Gomes